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Joseane Teixeira é jornalista
Foto por: Acervo pessoal
Joseane Teixeira é jornalista

OPINIÃO: Escola para quem precisa

Por: Joseane Teixeira
27/09/2020 às 14:45
Opinião

É controverso que bares estejam lotados de clientes obesos, fumantes e hipertensos e as escolas fechadas para quem precisa de um porto seguro. A precaução virou as costas para o bom senso.


Tenho acompanhado algumas entrevistas com os 10 candidatos à Prefeitura de Rio Preto e me chama atenção os discursos generalizados, que tocam sempre nos "chavões” eleitorais: economia (principalmente), segurança e, vez ou outra, educação. Sinto falta de algo que seja mais objetivo do que "vamos trabalhar pelo desenvolvimento da cidade”. Propostas, de fato. Mais do que discurso batido e decorado.

No que tange à educação, entra ano e sai ano, algum aspirante à cadeira mais importante do Executivo municipal vai prometer escola em tempo integral.

Para as disputadíssimas campanhas eleitorais, quem pode mais se "arma” com os melhores especialistas em marketing, mas falta sempre o "técnico em vivência”.

Aquele que sabe que o problema mais urgente na rede municipal de ensino é a extensão do horário de atendimento das creches. Mal desconfiam que é muito mais fácil (e barato) cumprir a promessa das creches até as 19h do que escola o dia todo. Essa é uma dificuldade antiga dos pais, que trabalham em horário comercial e precisam delegar a terceiros a função de buscar seus pequenos nas escolas. Ou "negociar” com o patrão uma saída antecipada.

Especialmente nesses tempos de pandemia, o olhar do eleitor busca um candidato que se antecipe às crises, amparado por um comitê gestor capaz de minimizar os impactos econômicos e sociais na população, sem medo de apresentar soluções que fujam às regras. Precisamos de líderes que não se conformem com o problema e fechem a cidade, colapsando todos os setores, mas que encontrem saídas inteligentes para a crise, sem politicagem.

Para ilustrar o embaraço, digo que não há outra palavra para classificar, a não ser insensibilidade, quando a Prefeitura de Rio Preto se baseia em uma pesquisa respondida por parte dos pais para decidir manter as escolas municipais fechadas até o fim do ano.

Se tivermos um olhar objetivo apenas para os números, a decisão parece democrática, já que 75% dos responsáveis manifestaram-se contra o retorno das aulas presenciais.

Mas é importante lembrar que se espera dos nossos representantes um olhar mais humano quando as decisões envolvem, também, um contexto assistencial.

O percentual de 25% dos pais favoráveis ao retorno pode não ser composto apenas por negacionistas - aqueles que subestimam o risco do coronavírus - mas inclui também um grupo significativo que não conta com uma rede de apoio para zelar da criança enquanto os adultos se vêem obrigados a retomar a rotina.

E eu provo. Esse número é diretamente proporcional ao índice de alunos da rede municipal infantil e fundamental que freqüentam a escola no período das férias.

Para quem não sabe, todos os anos, meses antes do recesso, a mesma Prefeitura realiza um censo entre os pais para saber se eles trabalham e se o aluno tem um familiar com quem possa ficar nas férias. Em caso negativo, a criança é recepcionada em uma escola a ser escolhida pela Secretaria da Educação (próxima do endereço do matriculado, podendo até ser a mesma que ela freqüenta), onde ela recebe alimentação e participa de brincadeiras pedagógicas, semelhante a uma colônia de férias. O conteúdo ministrado não influi na formação do aluno de forma a favorecê-lo em detrimento daqueles que passam as férias com a família.

Bem sabemos que o descanso é importante para a mente dos pequenos, mas não podemos ignorar o fato de que as férias escolares muitas vezes não coincidem com as do trabalhador assalariado.

Nesse contexto, reportagem da rádio CBN publicada em julho de 2018 mostrou que "Só 19% das crianças em creches dependem primordialmente do serviço”. Dêem um Google.

Os números se mantêm estáveis ano a ano e se aproximam dos 25% favoráveis ao retorno das aulas. Dá até pra excluir os negacionistas.

Mas o que eu pretendo com toda essa exposição? Mostrar aos políticos que há soluções seguras e mais humanitárias do que fechar as portas das escolas e entregar as crianças menos favorecidas à própria sorte.

A saída está justamente em atender o percentual mínimo de alunos cujos pais necessitam do atendimento. Mas e os professores?

Assim como não é consenso entre os pais, há educadores, ainda que sejam minoria, dispostos a retomar as aulas. Reportagem publicada na última semana pelo Diário da Região mostrou que os professores estão trabalhando mais nessa pandemia, porque precisam preparar a aula e gravar o conteúdo. Além de estarem disponíveis para pais e alunos para responder dúvidas.

É possível realizar uma breve pesquisa para saber quais profissionais, fora do grupo de risco, se voluntariam para atender a essa demanda especial. Principalmente aqueles que prestam serviços às creches conveniadas, já que os concursados estão com os salários garantidos.

Mais salas podem ser disponibilizadas para diminuir o número de crianças por espaço. Embora legítima a preocupação com os pequenos, ainda incapazes de hábitos regulares de higiene, o número reduzido de crianças por sala possibilita o maior controle sanitário.

Além do mais, a ciência já provou que as crianças são o grupo mais resistente à manifestação do vírus, havendo pouca incidência de agravamento do estado de saúde nos pequenos.

É controverso que bares estejam lotados de clientes obesos, fumantes e hipertensos e as escolas fechadas para quem precisa de um porto seguro. A precaução virou as costas para o bom senso.

Não podemos fechar os olhos para o fato de que, sem assistência da escola, mães sem rede de apoio estão perdendo o emprego ou pedindo demissão. Famílias estão passando necessidade financeira porque o responsável (lê-se mãe, de novo), se vê impedido de buscar uma recolocação profissional.

Seria incongruente negar que as crianças, também fora da escola, estão suscetíveis a testar positivo, já que na maioria dos casos são cuidadas por avós – estes sim, grupo de risco.

E por fim, o mais preocupante: crianças sob os cuidados de vizinhos ou conhecidos, aparentemente bem intencionados, mas que acabam expostas a abusos sexuais revelados, frequentemente, muito após a violência sofrida, quando o infante já não suporta mais o peso do silêncio.

Pode soar exagerado mencionar esse detalhe, mas só para quem não freqüenta a Central de Flagrantes há sete anos. Se o poder público se preocupa realmente com as crianças, não pode tomar decisões amparado apenas em números.

Esta mãe que vos escreve integra uma família de classe D, que mora na Caic e que faz parte dos 25% que sentem na pele as conseqüências das políticas eficientes no discurso, mas pouco filantrópicas no sentido amplo.

Para os próximos quatro anos, esperamos que os ouvidos dos nossos governantes estejam atentos para os técnicos em vivência.

Joseane Teixeira, 33 anos, é formada em Publicidade e Propaganda e Jornalismo. Atua há 7 anos como repórter nas editorias de Polícia e Justiça, sendo dois anos pelo Diário da Região e cinco pela rádio CBN Grandes Lagos, onde trabalha atualmente.

Confira Ponto de Vista da jornalista Ana Rogéria, da Record TV Rio Preto, nesta terça-feira (29)







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