Há tantos séculos que o machismo tem se propagado e se consolidado que até mesmo quem em nada se beneficia deste modo de pensar e agir muitas vezes aceita, reproduz ou se conforma.
Negar tradições
baseadas em preconceitos e irracionalidades ou em aspectos da sociedade que já
se transformaram, ainda que evidentemente prejudiciais para todos pode soar
como uma afronta aos líderes e a seus fiéis súditos – alguns dos quais se
beneficiam diretamente com essas tradições e outros que esperam se beneficiar
delas um dia - e acabar sendo motivo de
banir do grupo ou da família aqueles que se opõem.
Quem nunca teve
vontade de dizer não aos pais ou chefes e não o fez? Nesse sentido, se na
construção e consolidação das regras não puder haver contrários, negação, ou
pelo menos discórdia, isso significa que não existe diálogo, aliás, não existe
nem construção e sim, imposição infantil. As chamadas "características
femininas” ou "qualidades femininas” como a tolerância, a disposição para a
conversa e o silencio em determinados momentos – embora para as mulheres, a
ideia de que não devem se manifestar é sempre muito mais forte -, para os quais
somos exaustivamente treinadas, deveria ser treino de todos os adultos maduros.
A estigmatização do
que é masculino e do que é feminino não somente é prejudicial às mulheres, mas
também aos homens e principalmente às crianças de ambos os sexos. Um exemplo? A
ideia de que os homens não devem chorar. E se os homens não choram, pergunto o
que se sugere que façam com suas tristezas ou com seu luto ou com sua raiva? Diante
das brincadeiras, as crianças não deveriam ser impedidas de brincar de todas as
formas. O brincar é unissexual. O brincar é linguagem. O brincar é
representação e, principalmente, é sociabilização.
Meninos podem gostar
de rosas e meninas podem gostar de ferramentas. Há muitas profissões que exigem
talentos diferentes e nossas crianças precisam vislumbrar mais oportunidades de
atuação para que se realizem com satisfação. Deixemos as crianças colorirem e
melhorarem este planeta cansado de ser depreciado pelos péssimos costumes dos
antepassados que insistimos manter nessa deficiente mentalidade de
padronização. Temos bons costumes? Sem dúvida, sim. Exercitemos também junto
com nossas crianças identificarmos o que deve ser mantido e o que deve ser
abolido de nossos hábitos.
Somos muitos e
muitas nesta luta! Os 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher
é um exemplo de que não estamos sozinhos nessa jornada contra a violência,
fruto do machismo internalizado e externalizado, que é prejudicial para todos, mas
para as mulheres tem um significado muito pior: machuca, incapacita, mata. Não
há lucro para ninguém. Parem de nos matar! Denunciemos a violência, hoje e
sempre, discando 180, combatendo cotidianamente o machismo e o racismo,
protegendo-nos mutuamente.
Eliara Magalhães, psicóloga, psicoterapeuta, vegana,
ativista pelos direitos humanos e membra do Coletivo Mulheres na Política - 21
dias, 21 vozes femininas pelo fim da
violência contra a mulher.