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Saiba o que é fatwa, que motiva perseguição a Salman Rushdie

Por: FOLHAPRESS - DIOGO BERCITO
12/08/2022 às 18:00
Famosos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O escritor Salman Rushdie vive em perigo há mais de três décadas, desde que um decreto religioso clamou por sua morte. Apesar de nã...


SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O escritor Salman Rushdie vive em perigo há mais de três décadas, desde que um decreto religioso clamou por sua morte. Apesar de não haver por ora informações sobre a motivação do homem que o esfaqueou na sexta-feira (12), o episódio reacendeu o debate sobre a violenta intersecção entre a literatura contemporânea, a liberdade de expressão e o fundamentalismo.

Em 1988, Rushdie incomodou leitores fanáticos ao publicar seu romance "Versos Satânicos". O livro, de realismo mágico, costura a história de dois indianos no Reino Unido com a vida de Maomé, o profeta do islã que viveu nos séculos 6 e 7. O título se refere ao episódio, narrado por certas fontes islâmicas, em que Satã enganou Maomé ao soprar-lhe versos autorizando o politeísmo.

A ideia de que Satã influenciou o Alcorão, ainda que temporariamente, é perigosa. Líderes religiosos hoje rejeitam o episódio com base na doutrina de que Maomé era moralmente infalível --e não poderia, pois, se enganar e minar a autoridade do Deus único do islã. Rushdie tocou, assim, em um ponto sensível ao dedicar todo um romance aos tais versos demoníacos.

O livro, no entanto, tem diversos outros elementos indigestos para os fundamentalistas. Maomé aparece com o nome de Mahound, usado por cristãos no passado para vilipendiar o profeta. A cidade sagrada de Meca é chamada de Jahilia, termo árabe que se refere à era de ignorância anterior ao islã. Rushdie empresta o nome de esposas do profeta Maomé para prostitutas.

A publicação de "Versos Satânicos" coincidiu com um crescente extremismo entre alguns setores islâmicos, plasmado na instituição de um regime ultra-religioso no Irã após a revolução de 1979. Em 1989, o aiatolá Khomeini --a máxima autoridade do país em termos de fé e política-- emitiu um edito religioso pedindo que muçulmanos matassem Rushdie para puni-lo pela heresia.

O decreto de Khomeini acabou popularizando o termo fatwa, às vezes soletrado como fátua em português. Mas essa leitura extrema e literal da fatwa que é defendida pelo aiatolá não representa a riqueza do islã nem a sua história de tolerância.

Mais do que um decreto, uma fatwa é uma opinião religiosa. Um indivíduo procura um mufti com uma dúvida e o mufti responde com uma fatwa. Ambos, "mufti" e "fatwa", tem a mesma raiz no árabe. Em tese, uma fatwa não é um imperativo. Um fiel tem liberdade para ignorá-la ou até procurar uma segunda opinião.

Na versão extrema do aiatolá, porém, a fatwa contra Rushdie teve o peso urgente de uma lei. A ordem era clara: Khomeini exigia que muçulmanos matassem o autor. Foi como extremistas entenderam a mensagem, e foi com base nessa interpretação radical que eles tentaram nessas três décadas alvejar Rushdie.

O presidente iraniano Mohammad Khatami chegou a anunciar em 1998 que seu país não apoiava mais a fatwa. Ele foi desmentido, porém, por líderes religiosos que disseram que apenas o autor do decreto poderia cancelá-lo. Khomeini morreu em 1989, logo após emitir a fatwa. Em teoria, o decreto segue válido, para os radicais.

O Irã dos aiatolás e a violência dos extremistas que há décadas perseguem o autor de "Versos Satânicos" não falam em nome do islã. Se o esfaqueamento de Rushdie tiver tido motivação religiosa, tampouco deve se transformar em um argumento para criticar todos os muçulmanos com base nos atos de alguns.



Publicado em Fri, 12 Aug 2022 17:46:00 -0300







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