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CRÍTICA: ’Enola Holmes’, da Netflix, diverte, mas força um feminismo enfadonho

Por: Miguel Flauzino
23/10/2020 às 09:11
Cultura e Diversão

Uma das lições mais interessantes de se ver em ‘Enola Holmes’ é a de que podemos ser quem quisermos, basta escolhermos.


No contexto da produção, a mãe da protagonista dizia isso para afirmar a filha que ela poderia ser quem ela quisesse, independente dos padrões sociais. Ainda hoje presenciamos costumes que nos prendem a conservadorismos ruins para o desenvolvimento de quem nós realmente somos – ou deveríamos/queríamos ser. E esta é uma bela moral que o filme nos traz: seja você mesmo, a escolha é sua.

Enola é a caçula de dois irmãos, Mycroft e Sherlock Holmes. Quando sua mãe desaparece, a jovem detetive tem de descobrir para onde ela foi. Mas, depois de conhecer o perseguido Lord Tewksbury, sua trajetória muda de percurso.

Dinâmica e divertida, a primeira meia hora de ‘Enola Holmes’ trabalha bem sua montagem – me lembrou ‘Entre Facas e Segredos’ em certos momentos, mas claro, este é muito superior que a produção da Netflix. Com cortes e cenas bem encaixadas, o longa garante uma apresentação gostosa de assistir. Contudo, este feito perde força da metade para o final, onde a melancolia e o dramatismo acabam tomando conta e, consequentemente, saturam a narrativa, deixando-a mais lenta; o romance adolescente que foi implantado é tedioso.

O feminismo expressado em tela é importante e necessário. Apesar de apresentar certas hipocrisias – Enola vive falando que não depende de ninguém, mas houve dois casos em que ela nitidamente dependeu de Tewksbury, ou do contrário não existiria mais história –, o contexto em geral funciona, demonstrando a independência e a força feminina convincentemente. 

A problematização disso se encontra na representação do homem. O diretor, Harry Bradbeer, parece apresentar todos os homens como desprezíveis (Mycroft), ingênuos (Sherlock), maus (homem do chapéu) e até mesmo mimados (Lord) – que só não chamo de burro porque há certo momento em que o diretor vira e praticamente fala para o espectador: "Calma, pessoal. Ele não tão burro assim, só um pouquinho”. Me refiro à cena em que Enola está na casa da árvore.

Mas não para por aí. Antes, somente neste parágrafo darei um spoiler: ao revelar que a vilã é uma mulher, Bradbeer está tão imerso em sua visão feminista que não assume quem ela realmente é. Perceba que o homem do chapéu atira agressivamente e retrata uma verdadeira ameaça, mas quando chega a vez da vó de Tewksbury, o tiro não surge efeito, tanto no neto, como na protagonista. Até mesmo depois dos fatos, o filme evita mostrar a vilã sendo presa.

Apesar destes escorregões, há algumas qualidades que devem ser citadas. O primeiro destaque vai para o carisma e o desempenho de Millie Bobby Brown. Juntamente ao roteiro e principalmente a quebra da quarta parede, a atriz interpreta uma protagonista divertida. A técnica de falar com o público funciona na maioria das vezes, tirando sorrisos e criando ainda mais empatia com o espectador.

Também vale lembrar de Helena Bonham Carter (Eudoria). Sinceramente, não poderia haver melhor atriz para trazer vida a tal personagem. Mesmo não tendo minutos consecutivos na tela, Bonham faz uma mãe determinada e, como dizem seus filhos, perigosa. 
O mais intrigante é perceber que o termo "perigosa” não se encaixa necessariamente por ela fazer experimentos e desenvolver armas, mas, na verdade, no fato de que para uma sociedade patriarcal da época, uma mulher tão independente e fora de determinados padrões deve, realmente, ser uma ameaça.

E por último, mas não menos importante, devo enfatizar a bela escolha e trabalho da direção de arte em uma das cenas finais. Onde em uma casa imensa, com corredores largos e detalhada em inúmeras armaduras de cavaleiros, afloram sentimentos de apreensão e tensão no espectador – entretanto, é só essa cena mesmo, do resto, figurinos e cenários seguem esquecíveis.

‘Enola Holmes’ se compara como uma bela barra de chocolate batida ao leite. Ou seja, no primeiro momento, é deliciosa e saborosa, mas passados alguns minutos, você percebe que é apenas comum.

Nota: 3/5 (Bom)


Miguel Flauzino é estudante de jornalismo, criador e diretor do estúdio Verona e apaixonado pela Sétima Arte









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