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Em vez de antecipar segundo turno, sociedade quer alternativas, diz empresário

Por: FOLHAPRESS - JOANA CUNHA
21/05/2022 às 17:00
Brasil e Mundo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto cresce a pressão por voto útil em Lula ou Bolsonaro no primeiro turno, um dos maiores entusiastas da terceira via no empresa...


SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto cresce a pressão por voto útil em Lula ou Bolsonaro no primeiro turno, um dos maiores entusiastas da terceira via no empresariado, Pedro Wongtschowski, presidente do conselho da Ultrapar, ainda insiste.

"O interesse da sociedade é ter alternativas. E, obviamente, o que está implícito, é a insatisfação com essas duas", diz.

Wongtschowski, que ao lado de outros dois representantes de peso do setor privado, Pedro Passos e Horácio Lafer Piva, vem expressando preocupação com o futuro do país, diz que vê no empresariado um receio pela resistência da institucionalidade brasileira.

Para o empresário, que entre as outras cadeiras que ocupa também preside o conselho consultivo da Anpei (associação de pesquisa e desenvolvimento de empresas inovadoras), é preciso criar condições para valorizar o conhecimento, se o país quiser uma sociedade com mais inovação.

"Um setor empresarial que não dá lucro é ruim para a sociedade. Quando uma empresa vai mal financeiramente, ela reduz esses investimentos porque a preocupação dela é a sobrevivência a curto prazo. Com isso, se torna menos competitiva e investe ainda menos em inovação. É um ciclo vicioso", diz.

Folha - Como avalia a posição da indústria hoje?

Pedro Wongtschowski - O Brasil está em 57º lugar no índice global de inovação. É ruim. Uma economia do tamanho da brasileira, que está aí entre as 15 maiores do mundo, é sofisticada, tem atividade industrial relevante, moderna, uma atividade agrícola atualizada tecnologicamente, setor financeiro sofisticado e uma academia bem formada.

Se temos tudo isso, por que o Brasil está em 57º? É um indício de que a inovação do Brasil é insuficiente e inadequada. Qual é o indutor da inovação? É o interesse econômico do setor empresarial. É a busca da lucratividade e da sobrevivência da empresa a longo prazo.

Muita gente acha que a inovação tem de ser feita na universidade. A universidade desenvolve ciência, processos, mas que só se transformam em inovação quando chegam ao mercado. E chega por dois caminhos: pelo setor empresarial ou pelo governo. Por exemplo, a segurança pública do Ceará evoluiu porque eles usaram inteligência artificial e levaram ciência para a segurança pública. Isso vale para saneamento, agricultura, tratamento de dependentes químicos.

O setor público melhora a qualidade dos serviços que presta quando incorpora o conhecimento e a ciência ao processo decisório. Se você quer uma sociedade mais inovadora, tem de criar as condições para que as empresas e os governos valorizem o conhecimento.

Folha - Isso custa dinheiro, não?

Pedro Wongtschowski - Custa. Portanto, primeiro, o setor empresarial precisa ser lucrativo. Um setor empresarial que não dá lucro é ruim para a sociedade. Quando uma empresa vai mal financeiramente, ela reduz esses investimentos porque a preocupação dela é a sobrevivência a curto prazo. Com isso, se torna menos competitiva e investe ainda menos em inovação. É um ciclo vicioso.

Quem não tem que se preocupar com o dia seguinte consegue se preocupar com o médio e longo prazo, o que significa investir em pesquisa, desenvolvimento e inovação. O círculo virtuoso é quando a companhia é lucrativa e investe. Com isso, ela melhora sua posição de mercado, reduz custos, a sua lucratividade aumenta, eleva ainda mais investimento, dá oportunidade a seus profissionais, treina mais pessoas, cria novos produtos e assim por diante.

Com os governos é mais ou menos a mesma coisa. Melhora política pública e reduz custo. Com isso, tem mais sobra de dinheiro para mais investimento, mais inovação e entra no ciclo virtuoso.

Folha - O que isso exige?

Pedro Wongtschowski - Do lado do governo, racionalidade, lógica, valorização do conhecimento. E do setor empresarial, um ambiente de negócios favorável, abertura comercial, acesso ao conhecimento do Brasil e do exterior, competição justa.

Um dos grandes problemas do setor empresarial no Brasil é a informalidade. E a competição desleal, que existe na medida em que você paga imposto, segue as regras, e o seu competidor não o faz. Isso cria uma assimetria competitiva que prejudica a lucratividade das empresas e, portanto, a inovação. Quando a gente fala que a reforma tributária e importante, são diversas razões.

Folha - Corte de imposto como se viu recentemente no IPI também tem conflito com Zona Franca. Como desatar esses nós?

Pedro Wongtschowski - Zona Franca é uma questão complicada. Em sua maioria, não a totalidade, ela é algo extremamente artificial, que não para de pé sem subsídio. Se esse subsídio é um dinheiro bem aplicado, eu acho que não.

Agora, tem lá um milhão de pessoas empregadas, então, precisa criar um programa alternativo. Tem que entrar na bioeconomia, tem que fazer alguma coisa que tenha a ver com Amazônia. Um desenvolvimento que não seja uma linha de pecuária que implique em desmatamento generalizado.

Tem que encarar que a Zona Franca tem que mudar. Tem que se transformar em algo intrinsecamente competitivo e ligado aos fatores de produção que existem na Amazônia. É indústria farmacêutica, de fitoterápicos, alimentícia, vai ter que haver um investimento público para transformar o parque da Zona Franca em algo que tenha a ver com a região.

Folha - Um rumo mais vocacionado também depende da evolução de um desenvolvimento sustentável. Em um governo como o atual, como seria isso?

Pedro Wongtschowski - Escrevo com Pedro e Horácio uma série de artigos. Em um deles, falamos da indústria do futuro no Brasil. A gente fala especialmente dos dois grandes desafios da indústria brasileira que são a digitalização e a descarbonização.

Folha - Sobre o ano eleitoral, como o empresariado tem visto isso? E o sr., que sempre foi um dos principais entusiastas da terceira via?

Pedro Wongtschowski - O que a gente tem batalhado, uma porção de gente especialmente do setor empresarial, é a importância de o brasileiro ter alternativas. Não é razoável que a gente tenha apenas duas ou três alternativas de candidatos, de programas, de visões para o Brasil. É preciso mais.

A expectativa é que o resultado final tenha pelo menos influência de visões alternativas para o Brasil. Então, você ter múltiplas candidaturas, programas, debates substantivos sobre os caminhos do Brasil é uma coisa muito importante para todo mundo, para todo o cidadão brasileiro. Por que uma eleição tem dois turnos? No primeiro turno, você vota em quem você acha melhor. No segundo, vota contra quem você acha pior. Essa é a lógica.

Estão tentando antecipar o segundo turno para o primeiro. Está errado. Quem está tentando antecipar? Os dois, entre aspas, candidatos principais, têm interesse em antecipar esse processo para eliminar alternativas. O interesse da sociedade é ter alternativas. E, obviamente, o que está implícito, é a insatisfação com essas duas.

Folha - Sobre a escalada de ameaças às instituições, existe uma avaliação no empresariado de que isso é um risco ou prevalece a opinião de que é conversa de Bolsonaro para a torcida? Qual é o grau de preocupação?

Pedro Wongtschowski - Os empresários não são todos iguais. Dito isso, há sim uma preocupação muito grande com as instituições porque claramente o atual presidente está estressando. No momento em que coloca em dúvida a higidez do processo eleitoral, faz questão de armar a população, se aproxima das polícias militares estaduais, ameaça o STF, são todos indícios muito preocupantes. Em outros países esses movimentos antecederam evoluções autoritárias. Então, sim, há uma preocupação com a resistência da institucionalidade brasileira.

Folha - Tem algum movimento sendo preparado em defesa da democracia como no ano passado?

Pedro Wongtschowski - Está todo mundo de prontidão para fazê-lo se julgarmos necessário, uma espécie de uma assembleia permanente. Estamos acompanhando os fatos, com muita atenção o que vai acontecer nos próximos dias com esses partidos, MDB, PSDB, Cidadania, União Brasil, PSD, como vão se posicionar.

É provável que em algum momento volte a haver algum tipo de manifestação coletiva na direção de valorizar a democracia, sinalizar que tem um grande grupo de brasileiros que valoriza, acima de tudo, a continuidade de um regime democrático.

Folha - Com o seu conhecimento do setor de combustíveis, como vê solução para os preços?

Pedro Wongtschowski - Para mim, está claro que não é uma solução para isso tentar controlar o preço dos combustíveis e tentar destruir o conceito da paridade internacional dos produtos combustíveis no Brasil. Eu acho que ela é inexorável, inevitável. Primeiro, porque a Petrobras é uma companhia de mercado, mesmo que com maioria de capital votante pertencente à União. E segundo, porque o Brasil é deficitário em combustíveis, em decorrência, estruturalmente, a gente tem que importar parte. A produção é insuficiente para atender toda a demanda nacional. O que, automaticamente, já cria um vínculo entre o mercado brasileiro e o internacional.

Agora, não significa que o governo não possa corrigir situações específicas com medidas compensatórias, com subsídios explícitos bancados pelo Tesouro. Já fez isso no passado e é perfeitamente razoável que volte a fazer para segmentos específicos, para caminhoneiros, para GLP para a população de baixa renda.

De resto, é seguir as leis do mercado e esse preço vai ceder em algum momento. O preço do petróleo e dos combustíveis tende a ceder um pouco ao longo do tempo. Acho que daqui para adiante a situação vai tender a uma certa normalidade e o governo pode, se assim achar pertinente, intervir para achar soluções localizadas. Pode mexer no sistema tributário, pode reduzir impostos sobre combustíveis, que no Brasil tem valor muito alto. Tem uma série de medidas.



Raio-X


Tornou-se diretor da Ultrapar em 1985, foi CEO da empresa entre 2007 e 2012 e, atualmente, é presidente do conselho de administração. É presidente do conselho superior da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras) e do conselho superior de Inovação e Competitividade da Fiesp. É engenheiro químico, com mestrado e doutorado pela USP



Publicado em Sat, 21 May 2022 16:35:00 -0300







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