Quando alguma coisa não nos atinge diretamente, a gente leva um tempinho para assimilar.
Isso, sem dúvidas, explica porque ainda tem tanta
gente se descuidando na proteção contra o contágio da doença desse século.
Pessoas que vão a festas aos finais de semana, beber
e dançar sem máscaras, provavelmente não sentiram ainda, a perda de alguém
muito próximo e querido.
O mesmo sentimento também se verifica naqueles que
bradam contra o fechamento do comércio e o impedimento do trânsito livre em
certos lugares.
Ou é isso, ou então estamos cercados de loucos
insensíveis.
Eu perdi familiares e amigos durante a
pandemia. Assim, quando olho para os
meus mais próximos, vem o medo de que eu, de algum modo, os possa contaminar e
acarretar sua partida precoce, ou no mínimo seu sofrimento. O que faço
então? Me cuido mais.
Longe de desejar essa triste experiência a alguém,
qual seja, perder alguém, o que espero sim é que todos se sintam em risco e
passem a pensar menos em si mesmos e mais no próximo.
Ontem o Brasil viu ceifado da Terra, um de seus
filhos queridos. O ainda jovem talento
Paulo Gustavo, ator, humorista e diretor, protagonista de uma carreira
meteórica e que agradava a gregos e troianos.
Por conta de seu sucesso e carisma, muita gente acabou
por sentir que perdia nele, alguém "de casa”.
Muitos ficaram sensibilizados com sua partida.
Hoje pela manhã, acompanhando meu pai em sua sessão
de quimioterapia, ouvi de uma paciente ao lado a expressão triste de quem
afirma ter "perdido alguém da família”.
E logo em seguida, a confirmação dessa minha tese nada científica com a
frase: "caramba, esse vírus mata mesmo”.
Com base no episódio me pergunto em que momento isso
ainda não estava explícito? Nem com 400
mil mortos no país ou cerca de 3 mil ao dia a pessoa havia "se tocado”?
Só vejo uma explicação. É justamente por não ter perdido alguém tão
próximo até o momento, que a mulher tinha a impressão de que a COVID era algo
distante, que não a atingiria.
Estamos cercados pela doença. O entendimento de sua abrangência e
letalidade, ou ainda que ela não escolhe classe social, gênero, cor, faixa
etária ou credo, é o que pode, quem sabe, alterar a forma como todos estão
encarando a pandemia.
Bem alimentado, no melhor da idade, feliz e
inteligente, o ator tira de muitos a segurança de que o coronavírus não teria
sido feito pra todo mundo.
Mas foi. E se
não mudarmos a forma de agir e pensar, será apenas uma questão de tempo até ele
bater às portas das nossas casas.